quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Fotografia: Conceito em Expansão

Ainda hoje, apesar da crescente digitalização do processo fotográfico em todos os seus níveis, grande parte dos círculos teóricos e profissionais permanece ainda paralisada pela mística do “clique”, do “momento decisivo” (Cartier-Bresson, 1981: 384-386), daquele instante mágico em que o obturador pisca, deixando a luz entrar na câmera e sensibilizar o filme. 

Todo o demais, isto é, o antes e o depois do “clique”, é considerado afetação pictórica (icônica) ou “manipulação” intelectual (simbólica), fugindo portanto do âmbito do “específico” fotográfico. 

Já a digitalização e o processamento posterior da foto em computador permanecem ainda largamente contestados, no plano teórico, como procedimentos que se possam incluir no âmbito da fotografia, embora, a rigor, não exista diferença alguma entre o processamento da imagem em computador e a ampliação diferenciada das partes de uma foto através do sistema de zonas.

Mas o arranjo do objeto no seu espaço natural ou no estúdio, a disposição da iluminação, a modelação da pose, os ajustes do dispositivo técnico e todo o processo de codificação que acontece antes do “clique” é tão fotografia quanto o que acontece no “momento decisivo”.

Da mesma forma, também faz parte do universo da fotografia tudo o que acontece no momento seguinte: a revelação, a ampliação, o retoque, a correção e processamento da imagem, a posterização etc.

Vejamos alguns exemplos. Podemos citar, em primeiro lugar, a obra da fotógrafa norte-americana Cindy Sherman. Pelo que se sabe, ninguém discorda da inclusão dessa obra no âmbito da fotografia. 


No entanto e paradoxalmente, Sherman não fotografa, ou pelo menos não é ela quem se dedica ao trabalho de espiar pelo visor da câmera, enquadrar o motivo e clicar o botão do disparador. 


Na verdade, ela não poderia fazer isso, porque é sempre o referente, o objeto de suas próprias fotos e não poderia estar à frente e atrás da câmera ao mesmo tempo.

Quem manipula a câmera é um outro, ou vários outros, nunca nomeados. A fotógrafa transita, portanto e de forma ambígua, entre o sujeito e o objeto de suas próprias fotos. 
 Para Sherman, fotografar consiste menos em apontar a câmera para alguma coisa pré-existente e fixar a sua imagem na película, do que em criar cenários e situações imaginárias para oferecer à câmera, como acontece no cinema de ficção
 
A fotografia é aqui concebida como criação dramática e cenográfica, ou como mise-en-scène, onde a fotógrafa interpreta, ao mesmo tempo, os papéis de diretora, dramaturga, desenhista de cenários e atriz.













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