quarta-feira, 20 de outubro de 2010

A FOTOGRAFIA COMO EXPRESSÃO DE UM CONCEITO - Arlindo Machado

De tempos em tempos, a discussão sobre a natureza mais profunda da fotografia volta à tona com insistência. Nessas ocasiões, tudo o que parecia sólido se desmancha no ar. Dentro de mais algumas décadas, a fotografia irá completar dois séculos de existência e ainda estaremos tentando entendê-la.
O marinheiro e a enfermeira: a entrega total durante o beijo
 
A fotografia é a base tecnológica, conceitual e ideológica de todas as mídias contemporâneas e, por essa razão, compreendê-la, defini-la é um pouco também compreender e definir as estratégias semióticas, os modelos de construção e percepção, as estruturas de sustentação de toda a produção contemporânea de signos visuais e auditivos, sobretudo daquela que se faz através de mediação técnica.
 Harold Edgerton

Cada vez que um meio novo é introduzido, ele sacode as crenças anteriormente estabelecidas e nos obriga a voltar às origens para rever as bases a partir das quais edificamos a sociedade das mídias. A televisão e, por extensão, a imagem e som eletrônicos já nos fizeram enfrentar essa indagação há algumas décadas atrás.
Agora, o processamento digital e a modelação direta da imagem no computador colocam novos problemas e nos fazem olhar retrospectivamente para trás, no sentido de rever as explicações que até então sustentavam nossas práticas e teorias.


Num momento como este, em que a imagem e também o som passam a ser sintetizados a partir de equações matemáticas e modelos da física, num momento em que até mesmo o registro indicial fotográfico é memorizado sob forma numérica, boa parte dos nossos paradigmas teóricos precisam ser revistos.

Vilém Flusser, um pensador da técnica que, já em 1983, numa obra fundamental escrita sob o impacto do surgimento das imagens digitais, assegurou que a fotografia, mais que simplesmente registrar impressões do mundo físico, na verdade traduzia teorias científicas em imagens. 

O pensamento de Flusser, nesse sentido, é radical e sem concessões: a fotografia pode ter muitas funções e usos em nossa sociedade, mas o fundamento de sua existência está na materialização dos conceitos da ciência ou, para usar as palavras do próprio autor, ela “transforma conceitos em cenas” (1985: 45). 


 

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